Dias atrás, conversava com um amigo. Num dado momento
disse não saber se a vida teria tanta graça caso não tivesse a paralisia
cerebral que afeta minha coordenação motora. Depois de muito pensar a respeito,
eu afirmo: Não, não teria a menor graça.
Impossível dizer como seria. Certamente teria sido mais
fácil começar a andar. Um grande colégio de Barra Mansa não teria achado
difícil me ter como aluno. Poderia ter sido goleiro. Não teríamos gastado todo
esse dinheiro com minha reabilitação. Andaria de skate, talvez. Não seria
confundido com bêbados e doidões. Pode ser que tivesse mais desenvoltura e não travasse na hora de chegar nas meninas. Correria. Saltaria. Subiria em árvores. Faria um monte de
outras coisas que toda criança faz. Mas não seria eu.
Não teria feito papel de minhoca numa peça teatral no
colégio. Não teria sido o centro das atenções quando cheguei com uma máquina de
escrever elétrica para ser alfabetizado. Não conheceria meus terapeutas,
pessoas tão importantes durante todos esses anos. Não saberia como é gostosa a
sensação de fazer determinado movimento pela primeira vez. Não teria tido o
prazer de mandar tomar no cu aquele que me chamou de coitadinho. Não teria
demorado quase um ano pra tirar minha carteira de habilitação. Não riria dos
que pensam que estou chapado de ecstasy, LSD e outras drogas. Possivelmente não
escalaria. Não seria jornalista, editor, cinéfilo e tampouco documentarista. E
não estaria embarcando nessa (muito boa) viagem a três que se chama SeuFilme
Produções Audiovisuais LTDA.
Não sei como seria. E não quero saber.